Este mês de outubro marca, em Fortaleza, nove anos de espera do vereador Carlos Mesquita(PDT). Em outubro de 2012, ainda sob gestão da ex-prefeita Luizianne Lins (PT), o vereador anunciou que o Município iria atender a um pedido seu e inaugurar uma estátua em homenagem ao ex-prefeito Juraci Magalhães. Desde então, três gestores já comandaram a Prefeitura da Capital, mas ainda não há perspectiva de que o anúncio, feito há quase uma década, seja atendido.
Até lá, Mesquita diz que segue divulgando o legado do prefeito – e amigo – que comandou por mais tempo o Executivo municipal pós-redemocratização. Juraci é lembrado por obras grandiosas na Capital, mas terminou a vida pública colecionando polêmicas e sendo derrotado nas urnas.
Remontam à “Era Juraci” obras que atualmente fazem parte do cotidiano do fortalezense, como a Avenida Raul Barbosa e a Via Expressa, na área de mobilidade; além dosterminais de ônibus da Capital. O então prefeito também fez reformas que “mudaram a cara” de locais como a Praça do Ferreira e o Mercado Central, deixando os espaços com características arquitetônicas que permanecem até hoje.
TRAJETÓRIA POLÍTICA
Para o cientista político Cleyton Monte, que também é professor universitário e pesquisador do Laboratório de Estudos sobre Política, Eleições e Mídia (Lepem) da Universidade Federal do Ceará (UFC), um dos marcos na administração do ex-prefeito foi a descentralização.
“Ele mudou completamente a cara da cidade. Você pode até criticá-lo, fazer oposição ao que ele representou, mas não há como deixar de lembrar das mudanças administrativas que ele proporcionou”, aponta.
O pesquisador cita como exemplo a divisão da Cidade em regionais. O sistema de secretarias regionais segue até os dias atuais na administração da Capital. Inclusive, neste ano, o prefeito José Sarto (PDT) promoveu uma ampliação da quantidade de regionais, chegando a 12.
“Essa descentralização da administração aparece também no sistema de transporte público distribuído pela cidade. Outra ação dele foi implantar novas formas de contratação e iniciar a modernização da administração pública. Até a gestão dele, o sistema era mecanizado, então ele inicia a informatização”, aponta.
A criação dos terminais de ônibus da Capital é um marco na gestão de Juraci. “Na saúde, ele acionou o sistema de Frotinhas e Gonzaguinhas, que também descentralizaram o atendimento de média complexidade, até então concentrados no Instituto Dr. José Frota e no Hospital Geral de Fortaleza”, ressalta Monte.
A BUSCA PELAS ESTÁTUAS
Essas ações estavam na lista de argumentos usada pelo vereador Carlos Mesquita, em 2009, para sugerir a construção da estátua. A proposição ocorreu por meio de um projeto de indicação na Câmara.
“A era Juraci ficará para sempre na memória dos fortalezenses por causa da extraordinária visão de seu gestor que se imortalizará através de suas obras. A história fará justiça a Juraci Vieira Magalhães”, disse o parlamentar no projeto.
Inicialmente, a ideia era erguer o monumento no Aterro da Praia de Iracema, espaço também criado na gestão de Juraci. “Mas ele (Juraci) mesmo disse que não precisava de tudo isso, ele não queria que ficasse lá, então sugerimos instalar na Via Expressa e ele gostou da ideia”, revela Mesquita.
Em outubro de 2012, o próprio vereador anunciou a instalação da homenagem na via. O parlamentar, no momento da divulgação, carregava cartazes em homenagem ao amigo. “Tal qual o nosso Ferrão, Dr. Juraci, eu nunca vou lhe esquecer! Seu eterno líder”, escreveu.
Além do monumento que ficaria no começo da Via Expressa, próximo à Avenida Abolição, haveria ainda uma segunda estátua, a ser instalada posteriormente na Câmara Municipal. Na Via Expressa, o monumento previsto era de seis metros de altura, contando com a base. Todo feito de fibra, a obra levou em torno de oito meses para ficar pronta. A outra, de menor porte, teria dois metros de altura.
MONUMENTOS CUSTARAM R$ 100 MIL
As estátuas de Juraci foram feitas pelo escultor Franciner Macário Diniz. Ele é responsável pela estátua de Santa Edwiges, no Jacarecanga; a de Nossa Senhora de Fátima, no bairro de Fátima; além do monumento à Nossa Senhora da Assunção, no Conjunto Nova Assunção
As duas ficaram prontas já na época e custaram cerca de R$ 100 mil, pagos com recursos da Prefeitura, através de emenda parlamentar aprovada em 2011, como parte do orçamento previsto para aquele ano.
Ainda em 2012, a Secretaria Executiva Regional (SER II) informou que o pedido para a construção da estátua passou pela Procuradoria-Geral do Município (PGM), mas ainda estava na Regional, em análise da Prefeitura, comandada pela ex-prefeita Luizianne Lins (PT).
Ao longo dos oito anos da gestão Roberto Cláudio (PDT), a obra também não chegou a ser instalada.
“O Juraci merece toda essa homenagem. Na época, tinha ficado acertado que seria instalada na gestão do Roberto Cláudio, mas ele ficou os oito anos e não fez, agora está nas mãos do Sarto. Vou novamente buscar que esse reconhecimento seja feito”, prometeu, nesta semana, o vereador Carlos Mesquita.
Procurada, a atual gestão da Prefeitura não informou se há perspetiva para instalação dos monumentos.
‘TOCADOR DE OBRAS’
Além de amigo, Carlos Mesquita foi líder do Governo do ex-prefeito na Câmara Municipal e presidiu a Casa durante parte do mandato. Até hoje, o parlamentar se emociona ao falar do antigo aliado.
“Ele tinha obra espalhada por todo canto dessa cidade, tanto que tinha até um slogan dele que era: ‘basta abrir uma janela para ver uma obra do Juraci’. Ele ficou muito com a essa imagem de tocador de obras, que abriu a cidade e deu uma grandiosidade”, disse.
“O plano dele era que cada bairro tivesse tudo que é essencial para o cidadão: ao menos uma escola, ao menos um posto de saúde, ao menos uma creche e o terminal de ônibus”, destaca o parlamentar.
Em agosto de 1991, ao inaugurar a via que hoje é conhecida como Raul Barbosa, o prefeito também celebrou a marca de mil obras realizadas. “Nos orgulha saber que a população está satisfeita porque sabe que confia que os recursos que arrecadamos na forma de impostos retornam através de benefícios sociais”, salientou à época.
VEJA ALGUMAS OBRAS DE JURACI
- Reforma da Praça do Ferreira – Entregue em dezembro de 1991, a Praça do Ferreira passou por grande intervenção durante a gestão Juraci, ganhando os contornos do que atualmente é. À época, o projeto arquitetônico foi de Fausto Nilo e Delberg Ponce de Leon, que tentaram resgatar a praça dos tempos da inauguração, em 1933, onde existia a Coluna da Hora, cartão-postal da cidade. Aos pés da Coluna, foi instalada a fonte e mantida a cacimba, cavada em 1824.
- Novo Mercado Central – Entregue em janeiro de 1998, outra intervenção de Juraci foi a reforma do Mercado Central.
- Construção e prolongamento de vias – Uma das marcas de Juraci foi o conjunto de obras para facilitar o transporte entre partes da cidade. Em Fortaleza, ele foi responsável, por exemplo, por prolongar a Avenida Desembargador Moreira, trecho que virou a Avenida Raul Barbosa. O prefeito também esteve à frente obra da Via Expressa. Ele ainda realizou o prolongamento/alargamento das avenidas Engenheiro Santana Júnior, Alberto Sá, Antônio Sales, Pontes Vieira e Monsenhor Salazar.
- Reforma do IJF – Em 1993, na gestão Juraci, foi inaugurado o “novo Instituto Dr. José Frota”, com ampliação de mais de 400 leitos. Neste ano, o Governo do Estado e a Prefeitura de Fortaleza inauguraram mais uma torre do hospital, um prédio anexo à unidade de saúde principal que recebeu o nome de Doutor Juraci Magalhães.
- Construção do Aterro da Praia de Iracema – Obra polêmica do ex-prefeito, Juraci realizou a ampliação da faixa de areia da Praia de Iracema, criando o que hoje é o Aterro. A mudança também marcou a consolidação de Fortaleza como destino turístico no Brasil. A área passou por nova ampliação em 2019, na administração do ex-prefeito Roberto Cláudio.
- Terminais de ônibus – Um dos símbolos de Juraci foi a criação dos primeiros terminais de ônibus da Capital, espalhados por diversos bairros para interligar pontos da cidade. Atualmente, os terminais são os principais equipamentos do transporte coletivo de Fortaleza.
- Hospitais distritais – Ainda no modelo de descentralizar a administração, o ex-prefeito criou unidades de saúde distritais, que foram chamados de “Frotinhas” e “Gonzaguinhas”.
HISTÓRICO
O político foi o administrador que ficou mais tempo (1990-1992 e 1997-2004) comandando a Prefeitura da Capital nos últimos 100 anos, totalizando 10 anos e 9 meses.
Em primeiro lugar está o coronel Guilherme César Rocha, que ficou 20 anos no comando da cidade nos anos de 1892 a 1912, ainda na 1ª República.
Natural de Senador Pompeu, Juraci deixou a cidade para morar no que hoje é a cidade de Jaguaruana. Em 1949, mudou-se para Recife, onde se formou em Medicina (Dermatologia).
Ele foi casado com Zenaide Magalhães com quem teve dois filhos: Magalhães Neto e Nádia Benevides, esposa do ex-deputado Sérgio Benevides, que viria a protagonizar, em 1997, omaior escândalo de corrupção na administração de Juraci: o caso de desvio da merenda escolar, motivo pelo qual Sérgio acabou tendo o mandato de deputado estadual cassado.
Juraci teve como um dos primeiros aliados na política o então senador Mauro Benevides, que o introduziu na política. Já em disputas eleitorais, ele apareceu pela primeira vez em 1988, ao disputar como vice-prefeito na chapa liderada por Ciro Gomes.
GESTÃO JURACI
Eleito vice-prefeito, passou um ano e três meses no cargo, quando assumiu o Município em 1990, após Ciro renunciar ao mandatopara a disputa do Governo do Estado. Poucos meses depois, os dois políticos romperam, porque Juraci não acompanhou Ciro na decisão de deixar o PMDB para fundar o PSDB.
A partir dali, Juraci começa a realizar centenas de obras, chegando, em agosto de 1991, à marca histórica de mil obras. No auge da popularidade, o prefeito ainda conseguiu eleger, na eleição seguinte, em 1992 , em 1º turno, o seu secretário de Finanças, Antônio Cambraia.
Para Cleyton Monte, a imagem de “tocador de obras” rendeu frutos ao então prefeito, tanto que esse título chegou a ser disputado por gestores que ocuparam a prefeitura após Juraci.
“Essa busca por ser tocador de obra está ligada à percepção da população de uma liderança eficaz, que produz e é eficiente. Claro que isso se transforma em capital político. Quem inaugura, cria projetos, tem ideias para a cidade, passa uma imagem que contribui com uma boa avaliação”, afirma.
Só em 1994 ele retorna para disputar o Governo do Estado, tendo como adversário seu ex-aliado, Tasso Jereissati, que acabou eleito. Dois anos depois, Juraci foi eleito prefeito da Capital com 63,25% já no primeiro turno, um recorde de votação.
ESCÂNDALO
Também foi nesse período que denúncias de corrupção começaram a aparecer, como o famoso escândalo da merenda escolar, envolvendo o nome do deputado estadual Sérgio Benevides (PMDB), seu genro.
Ainda assim, Juraci foi reeleito em 2000 e permaneceu na Prefeitura até 2004, quando entregou o cargo para Luizianne Lins.
Conforme noticiou o Diário do Nordeste no dia de sua morte, 21 de janeiro de 2009, marcaram a administração de Juraci tanto a popularidade quanto os altos índices de rejeição apontados no seu terceiro mandato, devido aos escândalos e desgastes políticos.
Em 1993, quando entregou o cargo a Cambraia, teve 87% de aprovação. Já nas eleições de 2004, obteve 55% de desaprovação.
FIM DA CARREIRA POLÍTICA
O fim de Juraci na política se deu quando concorreu a deputado federal, em 2006, obtendo apenas 31 mil votos, ficando somente na 2ª suplência. Ainda assim, manteve o bom humor. Na época, questionado por jornalistas sobre o motivo da derrota, enfatizou: “faltou voto, meu filho”.
Juraci morreu no dia 21 de janeiro de 2009, em decorrência de disfunções múltiplas de órgãos, segundo o boletim médico divulgado pela direção do Hospital São Mateus, onde estava internado. Ele lutava contra um câncer de pulmão, diagnosticado 11 anos antes.